quarta-feira, 16 de abril de 2008

Bumbo de bruma

A luz se fez por entre brumas dublinenses. Hoje acordou um dia de inverno, frio, úmido e escuro, apesar do verão e do carnaval que anuncia seus primeiros gritos. Os telhados de zinco molhados testemunhavam o suave borrifo que caiu das nuvens ao longo da noite escura e profunda. Do mesmo modo, o asfalto exibia uma mistura heterohomogênea de água, óleo, pó, bingas de cigarro, entre outros restos lançados ao chão, testemunha da vida privada dos pedestres que por ali passaram no dia anterior.

Saio afora. Um morador de rua se desperta, olha o dia e murmura palavras ininteligíveis. Sons colidem no ar e caem ao rés-do-chão, desfeitos em seus significados. Lanço-lhe um olhar. Ele, estupefato com o flagrante, põe-se a rir. Esboço uma contração no músculo do canto direito da boca. Passo. No calçadão, ora vazio, um grupo de foliões ornados com colares havaianos sopra seus apitos e bate seu bumbo. Ainda é cedo, poucos cruzam pela vereda, anúncio da alegria às sólidas e suadas paredes de concreto dos edifícios que se eregem dos dois lados.

O dia se inicia. Ante o frio, tudo. Exceto a alegria gris.

12 comentários:

Pedro Favaro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Pedro Favaro disse...

Por que um texto delicado desses?
Esperava, com sua volta de bh, relatos sobre surubas homéricas e porres onde até o baço tinha que servir como fígado!

Carlos Wilker disse...

e o carnaval enfim termina... ou está apenas começando outra vez?

Carlos Wilker disse...

e eu mesmo respondo ao pedro: em meio à porres homéricos podemos encontrar muita delicadeza sim...

Carlos Wilker disse...

"Senta aí. Pega sua caneca, você sabe onde está.
Toma um gole, acabei de passar.
Forte, sem açucar...com pauzinho de canela.
Seu semblante está triste...pode chorar se quiser.
Dizem que faz bem, mas toma seu café."

Pedro Favaro disse...

ah, a poesia ébria que se encontra no volume azedado do vomitar somado ao exultante barulho da água da privada remexida pelo conteúdo estomacal...

:-)

Pedro Favaro disse...

Olha, postamos praticamente juntos...

muito bacana sua poesia...:-)

Lex disse...

Uau, quanta poesia, delicadeza e embriaguez! Quatro dias de "carnabelô", muita suruba de músicas e fazendo das tripas coração. Nem há muito mais o que dizer da invasão! Só que o gostinho de quero mais não tem sabor cagadinho, mas de milk shake de Nutella do Eddie.

Anônimo disse...

Meu Deeeeeuuuusssss... então é isso???????!!! A quarta-feira de cinzas começou segundona e esqueceram de me avisar?! Vc é um gênio, meu pequeno amante das camisas listradas!!!!
Milkshake de Nutella do Eddie!!! Milkshake de Nutella do Eddie!!! Milkshake de Nutella do Eddie!!! Milkshake de Nutella do Eddie!!!

Anônimo disse...

How bizarre, hehehehehe!
Esse seu texto é lindo - o postado, por óbvio. ^^

Gustavo disse...

Day after de pierrot, lembrei de mim procurando uma padaria às 6, 7, 8...gtxgbndt

Anônimo disse...

Gostinho delicioso de fim. A manhã arrancando o deleite da noite sem licença.

"Sons colidem no ar e caem ao rés-do-chão, desfeitos em seus significados." Você arrancando meu ar sem pedir.