quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Economia na cozinha

Ainda que os efeitos da crise não tenham afetado a todos, e esperamos que não afete, é chegada a hora de refletir a respeito desta tão falada fase econômica.

Desde a segunda quinzena de outubro, quando se desvelou o desaquecimento da economia estadunidense e européia, uma onda de pânico veio logo em seguida, levando consigo lucros, empregos e perspectivas de crescimento. Da noite para o dia começaram as demissões em massa e as reavaliações de preços de ações e dos cenários estratégicos.

Penso que seja o momento de questionarmos onde foi parar os anos e mais anos de lucros acumulados. Não é um tanto quanto incoerente que os anúncios de grandes faturamentos virem pó em tão pouco tempo? O que foi feito com esse excedente financeiro vindo do nosso trabalho? Afinal, se não fossem os empregados ora demitidos, não haveria produção e, por conseguinte, lucro a ser declarado.

Em recentes matérias veiculadas nos jornais, vimos que o tópico principal da pauta de reunião em Davos foi refletir sobre os motivos que levaram a tal crise e onde estava o erro dos governos por não terem "visto" nem feito nada por isso. Cabe lembrar que, pela corrente liberalista, o mercado, para que funcione segundo suas leis, não deve sofrer intervenções governamentais, a fim de que seja dada a auto-regulação através da demanda e da oferta. No entanto, o que vemos? Empresas com ações desvalorizadas pedindo ao governo – entidade até então não-interventora – que aja sobre a economia através de pacotes econômicos.

Neste momento, sintetizando o que foi anteriormente dito, deveríamos sentir-nos duplamente explorados. Em primeiro lugar por vendermos nossa mão-de-obra a empresas cujos acionistas não sabem administrar o dinheiro que ganharam em cima de nossa mais-valia; em segundo lugar, por sermos contribuintes de impostos para o Estado que, por sua vez, está dando (sim, dando) parte de suas reservas, que poderiam estar sendo investidas em educação e saúde, por exemplo, a esses mesmos administradores que provaram sua incapacidade de gestão. Ou seja, a quem serve o Estado? Aos seus cidadãos, ditos detentores do poder, ou aos interesses de uma minoria detentora do capital de produção?

É chegado o momento de rediscutirmos como funciona a economia em que vivemos até mesmo para entendermos qual nosso papel nela e o que podemos fazer para torná-la um modus vivendi mais justo para todos.

Na revista Istoé Dinheiro desta semana, a reportagem de capa traz vários executivos que estão driblando a crise e mostrando que, em alguns setores, ela tem passado longe. Vale a pena dar uma conferida no site.

E para um pouco mais de reflexão quanto ao sistema econômico, sugiro aos visitantes da cozinha que assistam esse vídeo muito interessante realizado por uma pesquisadora dos Estados Unidos: A história das coisas (parte 1/parte 2)

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Sinais, ondas e outras recepções

Não me sai nada. Afora, os carros-forte movimentam o dinheiro dos bancos, as ambulâncias cortam a cidade, os guardas tentam controlar o tráfego com seus apitos insistentes. Uma pena não poderem controlar o pensamento das gentes que passam de um lado para outro, todas com seus afazeres, todas apressadas, todas contra o tempo. Inutilmente contra o tempo. Inutilmente apressadas. Inutilmente pensantes.

Não me sai nada, apenas me chegam movimentos de uma cidade em constante atrito.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Despojos

Vou me converter.
Raspar o cabelo,
vestir branco,
usar sandálias.

Entrarei para um mosteiro,
devotarei minha vida a um deus,
acordarei cedo para as preces matutinas.

Lavrarei a terra,
batizar-me-ei.
Jejuarei ao longo dos dias,
alimentar-me-ei ao pôr-do-sol.

Agradecerei e louvarei
pelas flores e pelos grãos,
pelo calor e pela chuva,
pelo ocaso e pela aurora,
pelo fogo e pelo ar.

E assim, envolto em
simplicidade e equilíbrio
viverei
com o pouco que me basta.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Um dia perfeito de trabalho

O relógio marcava a aurora ainda não vista. Os olhos cerrados e a boca aberta para auxiliar a respiração não testemunhavam esse breve e fugaz momento em que somos brindados com uma nova manhã; quiçá com uma nova esperança, como se num passe de mágica o dia anterior tivesse se tornado apenas um a mais.

O despertador mecanicamente desprendia seu ruído: eram as primeiras palavras de bom dia que acudiam a seus ouvidos cansados de não escutar. Passara o fim de semana em um sítio e ficara deveras enfadado por descobrir que sabia distinguir os sons dos diferentes motores e, apesar de concordar que era belo o canto dos pássaros, comparava-o a uma orquestra polifônica descompassada.

Seguiam-se as saudações da cafeteira, da sanduicheira e da televisão com as notícias frescas do dia, mais frescas que o pão que comia. Ao entrar no banheiro para a última tentativa de dar ao corpo o ânimo que há um certo tempo perdera no meio do ar enfumaçado e translúcido da cidade, uma redenção: era feriado.

Sinos dobraram nos registros da ducha e os ralos pareciam gritar o aleluia.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Lobo do mar


Sentir soprar o vento
Eriçar as velas brancas
Sem pressa, sem tormento
Ao sabor das brisas mansas

Lançar prancha a cada porto
Sabendo-se feito todo de ar
Viver como marinheiro torto
Sem pátria, nação ou lar

Ver e disfrutar cada beleza
Tocar, sentir e provar
Contudo sem a certeza
De dois braços para onde voltar

Solitária é a vida do homem
Lobo criado no mar
Dorme à noite sem que sonhe
Com pátria, nação ou lar